Presenciar uma guerra não é fácil.
Presenciar uma guerra no Iraque- país muito conservador e, há pouco tempo,
comandado por um ditador- é mais complicado do que parece. Estar na guerra
antes, durante e depois é considerado um privilégio para jornalistas. Eles
passam por qualquer situação para conseguir aquele furo ou aquela história que
ninguém viu surgir no meio da multidão apavorada. Mas o medo, a angustia, e,
principalmente, a coragem andam juntos dos correspondentes.
Asne Seierstad, norueguesa e já conhecida pelo
livro “O livreiro de Cabul”, embarcou nessa aventura um tanto peculiar. Em seu
livro “101 dias em Bagdá” conta que foi por vontade própria que resolveu ir ao
Iraque em 2003 conhecer a guerra que estava por estourar no país. Já havia
coberto outras guerras no Oriente médio e ficou conhecida como correspondente
de guerras.
Seu livro é dividido em três capítulos: Antes,
Durante e Depois. Conta como foi a sua chegada em Bagdá e o sufoco para conseguir
um visto de jornalista. Diferentemente de qualquer outro país, no Iraque os
jornalistas são observados o tempo todo e precisam de autorização para visitar
cidades, bairros e edifícios; e até para falarem com pessoas nas ruas. Cada um
tem seu próprio tradutor designado pelo Ministério da Informação, obviamente
controlado pelo governo de Saddam Hussein. Asne primeiramente teve um tradutor
que não a ajudava com as suas perguntas pois seguia fielmente as regras do
ministério mas depois foi “abençoada” com Aliya que a ajudou a entender muitas
vozes iraquianas.
Antes e durante a guerra ninguém falava nada
sobre o governo. Todos ficavam calados ou tinham “frases prontas”. Dessa
maneira não chegaria a verdade, não iria ouvir o que o povo do Iraque realmente
pensava. Um homem lhe disse uma vez antes da guerra explodir: “Ninguém diz a verdade, ninguém. Você pode
parar de perguntar.”(p.107) Mas como uma boa jornalista ela não parou.
Registrou histórias comoventes de iraquianos que queriam sair da cidade mas não
podiam; outros que queriam ficar para proteger o seu país; famílias armazenando
alimentos e água desesperadamente. São tantas história diferentes e tantos
nomes parecidos que perde-se a conta.
Em seu livro conseguimos refletir muito bem
sobre a guerra contra os Estados Unidos. Vemos um lado que ninguém mostra tão
detalhadamente. Conseguimos entender e até sentir um pouco do medo que se passava
naquele país. As pessoas não queriam que acontecesse uma guerra mas ao mesmo
momento queriam se libertar do regime. Mas a ditadura era tão forte que nem
mesmo o povo conseguiu fazer uma rebelião contra o presidente.
Chega a um momento em que não sabe se fica para
cobrir a guerra ou se vai embora com medo. Asne suborna pessoas de alto cargo
para poder continuar no país enquanto os outros jornalista estão pagando para
irem embora. Não queria perder essa chance. Afinal é uma jornalista.
Excepcionalmente uma vez disse a um menino que fazia parte de um escudo humano
para voltar para casa. “Afastei-me demais do meu papel de repórter: observar e
testemunhar, sem empatia ou emoção.”(p.142) Logo a guerra começaria e milhares
de pessoas inocentes morreriam. O seu papel era transmitir para o que o Iraque
ou os Estados Unidos não deixavam o mundo ver. Correu o risco de usar o telefone
via satélite e fazer transmissões de dentro do hotel, mas o seu dever era
informar e não podia decepcionar os seus leitores ou espectadores.
Por mais que tenha corrido risco de morte, Asne
não deixou de cumprir o seu papel de informante. Seu livro é o que jornalistas
do mundo inteiro procuram: um lado diferente da história. Com ajuda da sua fiel
tradutora e de seu motorista (Amir) ela encontrou a ambiguidade do regime. Por
mais que os súditos de Saddam lutassem por ele, eles lutavam pela liberdade
acima de tudo. Depois, mesmo sendo xiita ou sunita, quando finalmente se
sentiram libertos gritaram, alguns agradecendo aos americanos outros odiando os
mesmos. Mas todos gritavam pela liberdade, ainda que fosse apenas dentro de
suas cabeças.
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